sexta-feira, 29 de abril de 2011

Vida: Eu quero x Tem mais mercado

Vou fazer uma comparação forçada. Não sei se vocês já fizeram isso: às vezes, quando jogo The Sims e vejo na aspiração do meu sim um sonho que não tinha planejado para ele, ignoro-o e executo meus próprios planos para o sim. Parece que o jogo virtual tem inspirado muitos pais brasileiros nos dias de hoje. Estou no 3º ano do ensino médio e o que mais vejo são adolescentes cujos pais escolhem o que eles deverão fazer como curso na faculdade e o que vão ser na vida profissional. Ou ainda, o jovem escolhe sua área, e, dentro desta, tem apenas o direito de optar pela faculdade, cujos futuros empregos possuem maior mercado, mesmo que estes trabalhos não sejam exatamente o que o pré-vestibulando deseja para si. Minha dúvida é a seguinte: será que o jovem brasileiro do século XXI está deixando de seguir seus sonhos e aspirações, para seguir uma vida monótona de robô imposta ou pelos pais ou pelo medo da ausência de mercados?
Há várias evidências que indicam que sim. A maior de todas, que me fez sentir necessidade de escrever este texto, foi o caso de minha colega. Ela está decidida, tem muita personalidade e, portanto, já escolheu o curso: Relações Internacionais (RI). Entretanto sua mãe teima que ela deve ser médica (RI, medicina? Parecidos?!). A vontade da mãe é tanta que, nos dias do vestibular do ano passado, fez a inscrição da filha na melhor faculdade de medicina do estado sem ela saber. Isso lhe custou meros 200 reais, que fariam falta no bolso mais tarde. A menina tentou vestibular para RI em todas as outras faculdades, curso para o qual tinha se dedicado o ano todo. E, mesmo assim, a mãe bateu o pé, ela teve de fazer a tal prova de medicina. Lembrem-se de que estamos falando do século XXI, época na qual dizem que a liberdade de expressão é maior do que nunca. O caso de minha colega não é o único, conheço outro menino que ficou alarmado quando eu disse, brincando, que sua mãe tinha colocado o nome dele na lista de alunos que iriam prestar vestibular para engenharia (ele odeia matemática, mas a mãe é engenheira). "Ela fez mesmo isso?!" Exclamou, preocupado. Pensei que ele entenderia a brincadeira na hora, tido o absurdo da possibilidade. Ainda posso citar meu professor, o qual disse que, para o pai, só existiam três cursos: engenharia, direito e medicina (maiores mercados). Ele foi obrigado a fazer um desses três, mas virou professor. Enfim, os casos são inúmeros, de assustar. Pior é quando o próprio jovem que não acredita em si mesmo. Minha amiga é doida para fazer psicologia, mas já pensou em fazer direito, pela maior chance de projeção no mercado, e em biblioteconomia, pela facilidade de passar. Ela pensa muito em desistir do seu sonho, por medo.
Os fatores causadores de tanto pânico na hora de escolher o curso já são conhecidos. Não há um investimento significativo em universidades no nosso país. Os alunos antes de tudo ficam com medo da relação vaga/candidato, já que são poucas as faculdades, quem dirá boas faculdades (e mesmo nossas boas são tidas como ruins no mercado exterior). Os índices de desistência em medicina (concorridíssimo) não são baixos. Outro fator determinante para o pânico é a falta de investimento nos diferentes empregos. Parece que o governo só dá valor aos cursos de engenharia, direito e medicina, possivelmente arquitetura e economia. Todos os outros cursos são desprezados. O porquê do desprezo é simples: o mercado para eles é muito restrito. O aluno sabe que se ele fizer filosofia, vai acabar “morrendo de fome”. Se fizer história ou letras, é certo que virará um professor e trabalhará muito para ganhar pouco. Se fizer algo relacionado a artes então... Não vai morrer de fome em Paris, vai ser aqui no Brasil mesmo. Não há investimentos nessas áreas. Existem leis de incentivo, mas não investimentos de fato. Cinema no país é terrível, a não ser que se façam comédias eróticas ou filmes de espiritismo, não se ganha dinheiro fácil com isso. E quem quiser ganhar, sofrerá uma vida de batalhas, para um resultado razoável. O mesmo acontece com as outras artes no Brasil. Vida de músico é uma loucura. Eles ganham dinheiro tocando em casamentos e dando aulas o dia todo, para lá e para cá nas casas dos alunos. Além dos artistas, os físicos, químicos, biólogos, antropólogos, psicólogos... Todos sofrem com a falta de emprego. Está mais que na hora deste quadro mudar. Tomemos o exemplo de países desenvolvidos, Estados Unidos que seja, lá não há tanto problema de seguir seus sonhos. Pesquisadores trabalham em universidades, artistas são valorizados (vejam o cinema deles!), professores idolatrados. Na Europa não é diferente. Japão idem. Ora, Brasil é um país emergente, porque não ser assim também?

O pior são as consequências dessa falta de investimento em diferentes trabalhos. Quem sofre é, como sempre, o povo. Por conta disso, nós adquirimos uma cultura de tendência ao imobilismo. Não lutamos por nada, não sonhamos com dias melhores. Estamos sempre imóveis. Sonhamos apenas em passar em um concurso público para trabalhar no mesmo emprego monótono a vida toda. Essa é a nossa grande ambição. Não haverá necessidade de se pensar em mais nada, já ficaremos garantidos com isso. Que se dane o desenvolvimento do país. Não estou criticando quem quer levar este tipo de vida, cada um escolhe o que é melhor para seu futuro. Critico o fato de acharmos que esse concurso público é a única alternativa de vida. Frase típica de brasileiro: “Brasil é uma droga. Esse país não vai para frente”. Talvez tenhamos achado aqui a causa do “não ir para frente”. Tudo começa com a educação, e estamos sendo educados a não ter sonhos grandes e vivermos parados a vida toda. Isso tem que mudar.
Não adianta querermos pedir ao governo para mudar esse quadro. Formar brasileiros com sonhos e conquistas poderia prejudicar a estabilidade da roubalheira deles. A mudança tem que partir de nós. Acredito que, se mudarmos nossa atitude aqui debaixo, e começarmos a querer o emprego dos sonhos, mesmo que este ainda não seja valorizado, o governo lá em cima será obrigado a mudar também. Eles fazem de tudo para agradar o povo, até para manter o poder. Só precisamos querer essa valorização de trabalhos diversos. Já fiz minha parte. Fui contra toda essa idiotice de clube engenharia-direito-medicina. Vou fazer cinema. Mas sozinha não consigo mudar o quadro. Alguém se habilita a me ajudar?